"Limpeza da cidade". Essa expressão, literalmente, significa retirar da cidade algo que não tem serventia, lixo, algo que pode gerar, inclusive, problemas para a saúde humana. No entanto, a matéria abaixo não se refere a lixo, mas a ser humano. É cada vez mais frequente observar ações do poder público no sentido de retirar das vias e espaços públicos mendigos, usuários de drogas e comerciantes ambulantes de forma autoritária e truculenta. O Estado, mais uma vez, busca resolver os problemas sociais como caso de polícia. Em época de grandes eventos, tais iniciativas devem se multiplicar no Brasil. Em muitos casos, por trás de um discurso moralista, de inclusive "salvar" as vidas dos excluídos, está a necessidade de mobilidade urbana, para os carros, ou de uma nova frente para investimentos imobiliários, como tem ocorrido em São Paulo, na famosa Crocolândia. Abaixo, segue uma breve matéria sobre leis aprovadas em Campinas-SP com intuito de "limpar a cidade".
Atolada
em uma crise política e administrativa que levou à cassação de dois
prefeitos, Campinas precisa avançar. E decidiu tirar os mendigos do
caminho, prova de que a maior cidade do interior paulista continua sem
rumo.
Às vésperas de ser eleito indiretamente pelos vereadores como titular
da prefeitura, no último dia 10, o ex-presidente da Câmara Municipal
Pedro Serafim (PDT) agilizou a aprovação de projetos de lei propostos
por colegas. Entre eles, estão duas leis antiesmola que dificilmente
seriam sancionadas em situações de normalidade política.
A primeira permite a colocação de placas em vias públicas para
alertar a população a não dar esmolas. Detalhe: as placas poderão ser
bancadas pela iniciativa privada, em troca de publicidade. Quais seriam
os dizeres? Não alimente os mendigos?
A segunda lei vai além. Sob o argumento de que obstruem o trânsito,
torna ilegais mendigos, vendedores ambulantes, malabaristas e sujeitos
que insistem em limpar o parabrisa de carros à espera do sinal verde. O
novo prefeito, que cumpre um mandato tampão com a promessa de um
"modelo empresarial", excluiu das atividades que atrapalhariam o
trânsito a distribuição de folhetos de propaganda, talvez o único item
que realmente merecesse apreciação no projeto de lei apresentado pelo
vereador Petterson Prado (PMDB), que desde 2005 via a iniciativa ser
rejeitada pela Câmara. O artigo foi rejeitado porque os folhetos são
fonte de receita para a Prefeitura, com a cobrança de taxas para a
liberação do serviço, e movimentam o próspero setor imobiliário da
região.
O pacote antiesmola também clama por segurança, obviamente. Coautor
da "socioeducativa" lei da plaquinha, o vereador Sérgio Benassi (PCdoB)
explica: "Em
Campinas já se demonstrou uma associação muito grande entre a
mendicância, o tráfico de crack e os roubos e pequenos furtos que
acontecem para abastecer essa cadeia de consumo." Para o colega Petterson, "o que nós temos aqui é um caso de crime travestido de mendicância."
Por isso, seu projeto prevê que a repressão da mendicância caberá à
Guarda Municipal, à Polícia Militar e à Polícia Civil. O recado é claro:
vaza, galera.
A validade da lei é questionável.
Não só vai contra o princípio constitucional de liberdade de ir e vir
como também atropela o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente),
abrindo brecha para considerar infratoras vítimas do trabalho infantil. A
"lei da esmola" é uma encenação de ordem pública em mais um caso de demofobia e criminalização da pobreza, raiz do caso Pinheirinho. Mostra apenas o quanto Campinas precisa de um modelo público — e não empresarial — de gestão.
Cartum do mexicano Darío Castillejos Lascares, premiado no 38º Salão de Humor; dica do @malvados.
Fonte: http://br.noticias.yahoo.com/blogs/michel-blanco/n%C3%A3o-alimente-os-mendigos-221348670.html
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