No dia 10 de maio, o blog divulgou artigo do geógrafo Thalismar M. Gonçalves intitulado A proliferação de “templos de consumo” na Serra-ES: apropriando-se do nosso tempo. No texto (http://cidadecomodireito.blogspot.com.br/2012/05/proliferacao-de-templos-de-consumo-na.html) o autor analisa o crescimento das construções de futuros shoppings em Serra - ES, refletindo também sobre a apropriação pelo capital dos momentos de lazer que acabam (in)diretamente sendo transformados em momentos de consumo.
Na última semana, Raquel Rolnik publicou texto que também discute sobre os shoppings, só que numa outra escala e enfoque: o crescente número de shoppings na cidade de São Paulo - SP e seus impactos a mobilidade e a cidade como um todo. Destaco o trecho sublinhado em amarelo pelo nosso blog, onde a autora questiona os atuais e tão utilizados estudos de impacto de trânsito.
Abaixo o texto publicado originalmente no yahoo blogs: Habitat
São Paulo não aguenta novos shoppings!
Por Raquel Rolnik | Habitat – qua, 23 de mai de 2012
Desde
o mês passado os paulistanos acompanham pelos jornais a novela sobre a
inauguração do Shopping JK Iguatemi, no bairro da Vila Olímpia. Prevista
para o dia 19 de abril, a inauguração do empreendimento foi proibida
pela Justiça porque as obras exigidas pela Prefeitura de São Paulo para
minimizar seus impactos no trânsito não foram concluídas. Além do
shopping, o empreendimento inclui duas torres comerciais, uma reforma no
prédio da loja Daslu, que passará a abrigar um teatro, e um banco.
É importante esclarecer que qualquer grande empreendimento em São
Paulo que se enquadre como polo gerador de tráfego, antes de iniciar
suas atividades, precisa realizar uma série de obras, a fim de minimizar
os impactos no trânsito do seu entorno. No caso do Shopping JK, até
agora, das exigências feitas, já foram realizadas a ampliação de uma
ciclovia e o alargamento da Marginal Pinheiros. Faltam ainda uma
passarela e um viaduto.Na semana passada, o shopping voltou ao noticiário porque a Procuradoria-Geral do Município de São Paulo emitiu um parecer dizendo que é possível inaugurar o shopping, dividindo em etapas a entrega das obras viárias exigidas pela prefeitura. O entendimento da Procuradoria é de que, como o complexo inteiro só ficará pronto em 2014, as obras viárias podem ser concluídas também neste prazo.
O que o noticiário não explicou é que o empreendimento já está dividido em etapas e que as obras mitigadoras exigidas foram estudadas a partir do impacto de cada etapa. A 1ª fase, correspondente ao edifício do Banco Santander, já foi concluída: as medidas mitigadoras foram entregues e o alvará emitido. A 2ª fase inclui justamente o Shopping JK Iguatemi, as duas torres comerciais e a reforma no prédio da Daslu.
Para inaugurar as obras desta 2ª fase, portanto, o empreendedor deve entregar o conjunto de obras viárias exigidas pela prefeitura para minimizar os impactos no trânsito. O que a Procuradoria propõe é a divisão da 2ª fase destas obras em três novas fases — uma 2ª que corresponda apenas à abertura do Shopping, uma terceira referente às duas torres de escritório e uma última referente ao prédio da Daslu.
No entanto, fica a pergunta: qual obra viária, isoladamente, minimizaria os impactos deste shopping, que terá quase 8 mil vagas de estacionamento? Certamente não serão a ciclovia, nem o alargamento da Marginal Pinheiros, partes concluídas até o momento. Até agora a CET não apresentou nenhum estudo que analise os impactos destas três novas fases separadamente...
Para além de saber a que corresponde, individualmente, o impacto de cada obra no trânsito da região, uma questão me parece mais importante e não tem a ver apenas com este caso: esse modelo de estudo de impacto do trânsito me parece que já está superado. Trata-se de um modelo que, ao considerar a construção de cada novo shopping, cada nova torre, não leva em conta que, na verdade, a cidade já está saturada para este tipo de empreendimento.
Dividir grandes empreendimentos de forma que ele pareça ser parte de um conjunto de obras de pequeno impacto não é novidade. Isso já é recorrente quando se trata de licenciamento ambiental. Também é comum, por exemplo, que empreendimentos habitacionais sejam feitos em fases para que não se enquadrem em parâmetros que requerem Estudo de Impacto de Vizinhança, que geralmente exigem medidas mitigadoras. Sobra para o poder público realizar estas obras ou deixar que a cidade "se vire", sem planejamento algum.
No fundo, este modelo acaba permitindo que cada vez mais novos empreendimentos de grande impacto sejam construídos, quando já está claro que a cidade não os suporta mais. Em Manhattan, em Nova York, por exemplo, não existem shoppings. Só se permite construir este tipo de empreendimento nas estradas, longe da cidade. Me parece que está mais do que na hora de dizer que em São Paulo não dá mais pra ter shopping, sobretudo em áreas que já estão supersaturadas, como é o caso da Vila Olímpia.