quinta-feira, 26 de maio de 2011

O código Florestal e as Usinas atômicas: o fim do país ou o fim da picada?

O congresso brasileiro representa, essencialmente, hoje, os interesses das empresas e dos empresários, apesar de parte de seus membros ser de origem sindical trabalhista. Mas o governo Dilma também não fica atrás, basta se ver o recente caso Palocci que usa de posição privilegiada para favorecer as empresas e enriquecer. Estamos assistindo à uma verdadeira imposição de classe de escolhas que engajarão e comprometerão todo o território, toda a população do Brasil. Abaixo listaremos apenas dois exemplos, mas outros tantos que se encontram em debate no congresso nacional, tais que a legislação de flexibilização nas licitações para a copa do mundo e as olimpíadas, a reforma da aposentadoria dos servidores, recuos na luta contra a homofobia, etc. Tudo isso sobre um fundo de chantagens e ameaças ao governo de Dilma Roussef por causa do caso de enriquecimento de Palocci, o governo para safar esse último de uma CPI abriu o balcão de negociações, inclusive revendo propostas que fez durante a campanha presidencial. Esse governo e o congresso estão anunciando um desastre para os trabalhadores e para a população como um todo.

O novo código florestal que acaba de ser votado na Câmara dos Deputados é o exemplo mais claro de como a lei não vale no país e como tudo se negocia, pois se perdoará todos aqueles que a infringiram, que ocuparam e/ou desmataram as áreas de preservação permanente (restingas, manguezais, margens dos rios, topos de morros, etc.). Além disso aqueles que ocuparam esses lugares ilegalmente até 2008 ali continuarão e não serão obrigados à recompor as área.

Assim, cerca de 2,4 bilhões de multas também serão anistiadas. A maior parte delas pelo desmatamento ilegal de Áreas de Preservação Permanente (APP) e de reservas legais em grandes propriedades da Amazônia Legal. Mato Grosso, Pará, Rondônia e Amazonas respondem por 85% do valor das multas aplicadas até julho de 2008 e ainda não pagas (Jornal da Câmara dos Deputados, 25 de maio de 2011).

Ficamos a pensar nos atos recentes contra os ocupantes pobres de terras públicas no município de Aracruz onde moravam 1.500 pessoas que foram desalojados pela policia militar e pela prefeitura municipal em nome da “ilegalidade”, e se as policias militares, o exército, a policia federal expulsassem as pessoas das áreas de proteção e de reserva legal ocupadas ilegalmente? Ou ainda as expulsassem das áreas públicas griladas no Espírito Santo e em outros lugares do país pelas empresas e latifúndios?

Mas a lei não pára por aí, conforme o Jornal da Câmara dos deputados do dia 25 de maio:
O projeto [agora lei aprovada] na câmara permite ainda que as faixas de proteção em rios continuam as mesmas de hoje (30 a 500 metros), mas passam a ser medidas a partir do leito regular e não do leito maior. A exceção é para os rios de até dez metros de largura, para os quais é permitida a recomposição de metade da faixa (15 metros) se ela já tiver sido desmatada.,Nas APPs de topo de morros, montes e serras com altura mínima de 100 metros e inclinação superior a 25°, o novo código permite a manutenção de culturas de espécies lenhosas (uva, maçã, café) ou de atividades silviculturais, assim como a infraestrutura física associada a elas. Isso vale também para os locais com altitude superior a 1,8 mil metros.
No Espírito Santo as propriedades rurais das regiões montanhosas que têm muitos eucaliptos e cafezais e muitos pequenos rios terá parte significativa dos infratores perdoados. Claro, em boa parte dessas terras são pequenos agricultores, camponeses, que trabalham para sua subsistência e que em função do perfil de suas propriedades se encontravam mais ou menos condicionados a reduzir as áreas disponíveis para as plantações. Mas a questão aqui é que todos vão aproveitar inclusive uma empresa como Aracruz Celulose-Fibria que terceiriza as plantações de eucalipto na região. Além do que agricultores que têm propriedades com até 4 módulos fiscais (de 20 à 400 hectares segundo os municípios) se infringiram a lei ocupando áreas de reserva legal até 2008 poderão assim continuar. Pensemos nas confusões e nas “liberalizações” que acontecerão entre os que têm ou não direito que ocuparam antes ou que estão ocupando agora por causa da aprovação da lei...

Sem contar que a emenda 164 da referida lei “dá aos estados o poder de estabelecer as atividades que possam justificar a regularização de áreas de preservação permanente (APPs) já desmatadas.”, e isso para todos os tipos e tamanhos de propriedades, o que vai permitir todos os abusos que imaginamos com uma indefinição do que já foi desmatado ou não, pois como o que foi ocupado ilegalmente, desmatado ilegalmente, será perdoado, e esses limites, após cadastros, somente serão estabelecido no prazo de um ano, até lá, pode-se apostar, que muitos desmatamentos serão efetuados. Inclusive o INPE recentemente identificou um aumento significativo do desmatamento na Amazônia (somente no Mato Grosso 480 Km2 de floresta foram desmatados em abril de 2011 o equivalente à 9 meses de desmatamento no mesmo estado entre agosto de 2009 e abril 2010, cf. Folha de São Paulo, 26 de maio de 2011) o que já antecipa os efeitos da famosa lei...

Mas o escândalo não para por aqui, ainda segundo o mesmo Jornal da Câmara, a lei não considera mais Áreas de Preservação Permanente:

As várzeas fora dos limites em torno dos rios, as veredas e os manguezais em toda sua extensão. Entretanto, são protegidas as restingas enquanto fixadoras de dunas ou para estabilizar a vegetação de mangue. Se a função ecológica do manguezal estiver comprometida, o corte de sua vegetação nativa somente poderá ser autorizado para obras habitacionais e de urbanização nas áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.

Essa parte pode significar a morte dos manguezais brasileiros já tão atacados por todos os lados, particularmente nas áreas urbanas, e o tiro de misericórdia nas várzeas e veredas. Na RMGV temos as várzeas do entorno do Mestre Álvaro que serão devastadas pelos interesses imobiliários e pela passagem de um contorno rodoviário.

Diante do exposto podemos medir o tamanho da destruição das florestas e dos diversos ecossistemas que está por vir, caminhando em sentido totalmente contrário ao interesse coletivo. Nem preciso é discorrer sobre a importância fundamental das árvores para o clima, para os solos, para a redução do gás carbônico, para a produção de oxigênio, para os remédios, para as espécies animais, para a vida. Destruindo as matas estaremos destruindo a Terra, o mundo, a humanidade. As árvores são as responsáveis dos mecanismos de equilíbrio de nosso ecossistema, sem elas vamos direto para uma catástrofe já. Até quando suportaremos passíveis a um bando de predadores apoiados por fortunas imensas e interesses do capitalismo globais. Estamos alimentando a China em soja, milho e ferro enquanto os chineses nos vendem os produtos manufaturados, estamos exportando água e destruição de florestas, e importando força de trabalho hiper-explorada, isso tudo para alimentar lucros enormes de um punhado de “donos de terra”, o senhor Caiado, Magri e outros tantos que compraram boa parte do congresso brasileiro.

O lixo atômico
Temos atualmente duas usinas nucleares funcionando mal em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, e uma outra, no mesmo lugar, com eterno problemas. Parte do governo Dilma e parte dos congressistas apóiam a expansão do parque de usinas nucleares no Brasil, alguns falam em construir 15 novas usinas (projetos do governo circulam nesse sentido). As empresas e o lobby militaro-industrial do nuclear são fortes no Brasil como em outros países. Mas depois do acidente em Fukushima no Japão a inquietude aumentou e diversas demandas no congresso nacional são feitas pedindo esclarecimentos sobre a segurança das centrais existentes. Mas o que é surpreendente é a irresponsabilidade e ganância e falta de ética, mais uma vez baseados no interesse financeiro e na estupidez, com que se avançam tais propostas.

O que não se fala ou muito pouco nas hostes dos poderes e dos interesses empresarias é - para além dos riscos de acidentes, dos custos enormes de construção dessas centrais e dos riscos que colocam para a população com uma poluição que não se vê, mas se sente (o iodo 131 o césio 137, dentre muitos outros) e que mataram milhares de pessoas em Tchernobil e comprometem uma área imensa no Japão colocando em risco a população do norte do país - é sobre o lixo nuclear. Propostas existem para se utilizar a cidade de Abadias em Goiás que recebeu já 6 mil toneladas de césio 137 provenientes de aparelhos de raio X. Ora, quando se decidiu construir as usinas de Angra dos Reis não se pensou, não se falou, não se previu, seriamente, com cálculos de custos, o destino do lixo nuclear. Agora 30 anos depois começa-se a procurar um sítio para esses rejeitos. Mais grave ainda, não se fala no futuro das instalações existentes que envelhecem e um dia ou outro deverão ser desmanteladas, mas por qual custo? Onde colocarão as peças das centrais desmanteladas? Quanto tempo levará esse processo? Silêncio de morte! Mas sabem porque? desmantelar uma central é coisa que pode durar dezenas de anos por um custo enorme e deve-se ter um lugar seguro para colocar essas peças cortadas uma por uma, pois no desmantelamento não se pode implodir o prédio das usinas simplesmente, há o reator, há as piscinas, há o concreto, há as estruturas metálicas que devem ser cortadas uma à uma.

A França que é um dos países mais nucleares do planeta (tem perto de 60 centrais nucleares), começou um programa de desmantelamento das centrais velhas (que tinham 20 – 30 anos de funcionamento) há já mais de 20 anos, a primeira delas, que fica nos Vosges, no norte do país, está sendo, com tecnologia de ponta, desmantelada há 25 anos e não se está perto de ver o trabalho concluído, até hoje o reator não foi desmantelado, a precaução é enorme e os meios engajados somente nesse usina gigantescos.

Assim, para além da delicadeza e do custo da operação na França, mas também na Alemanha, tem se uma imensa dificuldade para encontrar um sítio que possa comportar as milhões de toneladas de material radioativo durante milhares de anos de maneira segura, pois bem esse lugar não existe! Depois de irresponsavelmente os governos franceses até o inicio dos anos 1980 terem jogado os rejeitos das usinas nos mares, hoje eles simplesmente estão buscando colocar os rejeitos e os restos das usinas desmanteladas à 600 metros de profundidade dentro de uma camada de rocha argilosa na região de Champagne, no norte do país. Os técnicos das empresas nucleares asseguram que o solo não se move naquele lugar à milhões de anos. Ah, mas na Alemanha vizinha disseram a mesma coisa sobre uma antiga mina de sal onde estocaram milhares de tonéis radioativos, resultado: a mina se fissura, água infiltrou nos depósitos, o lençol freático corre sério risco de ser contaminado. Portanto, como na Alemanha, na França e outros países, em ponta na tecnologia nuclear, não encontram soluções e não querem e/ou não sabem como sair do nuclear, como nós que, ainda bem, “somente” temos 3 centrais podemos concordar em construir mais 15 – 20 centrais? Isso é um crime humano, é um atentado ao povo e ao país.

Os dois exemplos dados acima ilustram os jogos do poder e as ações concretas sobre nossas vidas das ações dos representantes do povo eleitos. Esses mesmos deveriam se basear na pluralidade, na publicidade e na liberdade de raciocínio fundados em princípios éticos e morais para tomar suas decisões com toda autonomia de pensamento e refletindo no interesse coletivo e público. E isso que esta nas bases do regime democrático moderno e que herdamos do século das luzes. O que temos visto são homens sem nenhuma moral, sem nenhuma ética, se submeterem ou fazerem parte de interesses escusos que são vendidos como interesse da nação, da soberania. O que pensar que a democracia atual é uma ilusão? Que não há saída, que o ceticismo é a única porta? Ou ainda que as ações de milhares de pessoas cada um em seu lugar de moradia, de trabalho, de vida, poderá fazer recuar esses projetos? Mas, então, saíamos às ruas!!

Cláudio Luiz Zanotelli
Professor do Departamento e do mestrado em geografia da UFES

Um comentário:

  1. Sobre a questão da Código Florestal,apesar dessa derrota relativa, penso que temos ficar atentos quando forem criadas as leis estaduais e municipais a partir dessa lei federal. Será que numa escala estadual ou municipal, possamos reduzir o estrago?

    Thalismar

    ResponderExcluir

Comente e contribua com o diálogo...